Série
de reflexões sobre a Bíblia, escrita e publicada originalmente em
inglês, no tumblr, pelo próprio autor Rob Bell e sua equipe.(http://robbellcom.tumblr.com/post/66107373947/what-is-the-bible).
Transcrito
e adaptado para portugues por Marcus Vinicius Epprecht com
autorização do autor. Proibida a reprodução para fins comerciais
ou qualquer forma de ganho sobre este texto sem a autorização
expressa do autor e do tradutor.
Revisado
por Felipe Epprecht Douverny.
Publicado
em português simultaneamente nos seguintes endereços:
Parte
1. Alguém escreveu alguma coisa
Tive
recentemente uma série de conversas que de alguma forma me levaram à
Bíblia. Digo “de alguma forma” porque não foram conversas com
amigos particularmente religiosos que me levaram à Biblia, e ainda
assim eles falavam sobre o seu interesse na Bíblia.
Alguns
reconhecem prontamente esta biblioteca particular de livros (sim, é
uma biblioteca, mais tarde falarei sobre isso...) que moldou a
civilização ocidental profundamente e de inúmeras maneiras, e
mesmo assim muitos não tem a menor noção do que a Bíblia
realmente é. E
mais: eles não têm a menor idéia sobre o que a Bíblia realmente
é, além de vagas referências como: Davi
matando Golias (Embora no livro de 2 Samuel esteja escrito que um
homem chamado El-Hanã matou Golias); ou advertências sinistras
sobre o fim do mundo (como no recente filme This Is The End, onde Jay
Baruchel fica lendo trechos do livro do Apocalipse para Seth Rogen,
Jonah Hill e James Franco, como se esse fosse o livro para ajudá-los
a entender por que o buraco em seu jardim na frente de sua casa
engoliu Rihanna ... ); ou histórias sobre Jesus fazendo coisas como
transformar água em vinho (Verdade? Esse foi o seu primeiro milagre?
Ele tornou possível que as pessoas continuassem a beber por dias a
fio? É por isso que Jesus foi acusado de ser um bêbado?).
Outros
ouvindo alguém citar a Bíblia, algo no que a pessoa disse os fez
pensar “não é possível que a Bíblia diga isso. E mesmo assim
eles não têm nenhuma maneira melhor ou mais bem informada de
combater a explicação que ouviram do outro, a não ser dizendo:
você não pode estar falando sério, isso é loucura!!!
Para
outros, a Bíblia os pegou desprevenidos. Eles tiveram uma
experiência, eles provaram alguma coisa, eles sentiram algo, eles
sofreram algo e
eles descobriram na Bíblia uma linguagem para o que tinham
experimentado. Eles foram injustiçados por alguém e sendo francos
consigo mesmos perceberam que eles queriam que a pessoa morresse de
um jeito violento e macabro. E descobriram que esses mesmos impulsos
estavam descritos em detalhes vívidos nos Salmos. Como é que alguém
que escreveu milhares de anos atrás, em um lugar diferente, em um
idioma diferente em uma cultura diferente pode descrever, com
detalhes tão surpreendentes, exatamente o que eu estou sentindo aqui
e agora, no mundo moderno? Como algo que muitos descartaram como
irrelevante pode ser às vezes tão chocantemente relevante?
Boas
perguntas!!!
Eu
vou chegar às perguntas.
Vou
começar com a forma como a bíblia passou a ser a Bíblia,
então
eu vou escrever sobre
inundações
e
peixe
e
torres
e
sacrifício
de crianças
tudo
a fim de explorar o que está acontecendo sob
a
superfície das histórias da Bíblia.
Então
eu vou abordar algumas das maneiras nas quais muitas pessoas foram
ensinadas a pensar e falar sobre a Bíblia -
como
a palavra de Deus, O Bom Livro, a palavra viva, os princípios para
viver, A Palavra, o padrão absoluto, A VERDADE INERRANTE SOBRE A
QUAL NÃO PODE HAVER DÚVIDA, a visão de Deus sobre as coisas, o
supremo manual do proprietário, e assim por diante.
- e
por que essas formas de pensar e falar sobre a Bíblia não estão
funcionando hoje da forma como costumavam para muitas e muitas
pessoas.
Tudo
isso me leva a articular uma forma de entender a Bíblia na qual a
mente e o coração estejam ambos totalmente engajados, em vê-la e
lê-la pelo que ela é: uma
vibrante, antiga, poética, revoltante, provocante, misteriosa,
reveladora, escandalosa e inspirada coleção de livros chamada “A
Bíblia”, que conta uma história,
uma
história que eu quero que você ouça.
Primeiro,
então, um pouco sobre como chegamos à Bíblia.
Alguém
escreveu algo.
Óbvio,
mas verdadeiro. É um importante ponto de partida.
A
Bíblia não caiu do céu, foi escrita por pessoas.
Mais
uma vez, óbvio, mas nos dá uma base para começar a pensar sobre o
que a Bíblia é. Muitas das histórias da Bíblia começaram como
tradições orais, transmitidas de geração em geração até que
alguém as colecionou, editou, e realmente as escreveu. Às vezes
centenas de anos mais tarde. Isto
é, anos e anos de pessoas sentadas em torno de fogueiras e
caminhadas ao longo das estradas empoeiradas e quentes, reunindo-se
para ouvir e discutir, debater e lutar com essas histórias.
As
pessoas que escreveram estes livros tinham muito material para
escolher. Havia
muitas histórias por aí, muitas coisas sendo transmitidas, muito
material a incluir.
Ou
não incluir.
(Há
um verso no livro do Antigo Testamento de 1 Reis 11, onde o autor
escreve:
Quanto
aos outros eventos do reinado de Salomão , tudo que ele fez e a
sabedoria que ele mostrou - porventura não estão escritos no livro
dos anais de Salomão?
Bem,
sim, eu acho que eles estão ... só que não temos idéia do que
ele esteja falando.
Interessante
a premissa por parte do autor de que não só sabemos disso, mas
temos acesso a esses anais.
O
que não temos.
Vemos
algo semelhante no evangelho de João, onde está escrito:
Jesus
realizou muitos outros sinais na presença dos discípulos, que não
estão registrados neste livro
e,
em seguida, o livro termina com esta linha:
Jesus
fez muitas outras coisas também. Se cada uma delas fosse escrita,
nem todos livros do mundo poderiam conter esses escritos.
É
como se o escritor, só para embrulhar as coisas, acrescentasse: Ah,
Sim! eu deixei uma tonelada de coisas para fora!!).
Os
autores dos livros da Bíblia, então, não estavam apenas
escrevendo, mas selecionando e editando e fazendo uma série de
decisões sobre sobre qual material e conteúdo apoiava/combinava ou
não com seus propósitos ao escrever.
Esses
escritores tinham agendas:
Lucas:
Eu também decidi escrever um relato ordenado para você ...
O
Livro de Ester : Isto é o que aconteceu ...
João:
Estes foram escritos para que creiais …
Havia
pontos que eles queriam expor, defender, ressaltar, coisas
que eles queriam que seus leitores vissem, idéias que queriam
compartilhar. Estes
escritores, é importante ressaltar, eram pessoas reais que viviam em
lugares e tempos reais. E
seus verdadeiros propósitos, intenções e agendas foram moldados
por seus tempos, e
lugares
e
contextos e economias e política e religião e tecnologia e inúmeros
outros fatores.
O
que nos diz sobre o mundo em que Abraão viveu, o fato de que, quando
lhe foi dito para oferecer seu filho como um sacrifício, ele tenha
partido para fazê-lo como se fosse uma coisa natural para um deus
pedir?
A
história de Davi e Golias começa com tecnologia. Os filisteus
tinham um novo tipo de metal, os israelitas não. A história é
amparada pelo medo primal que vem quando seu vizinho tem armas que
você não tem - como lanças. Ou equipamentos de guerra. Ou bombas.
Por
que o apóstolo Pedro usa a frase não
há outro nome debaixo do céu
... ?
Onde
ele conseguiu essa frase e que imagens de propaganda militar seriam
trazidas à mente de seus ouvintes ?
Pessoas
reais ,
escrevendo
em lugares reais ,
em
tempos reais ,
com
agendas ,
escolhendo
incluir algum material,
optando
por deixar de fora outro material,
tudo
porque eles tinham histórias para contar.
Dito
isto, dois pensamentos para encerrar esta introdução:
Em
primeiro lugar, para alguns, a Bíblia é apenas uma coleção de
livros antigos.
Livros
escritos por pessoas, e nada mais. Para outros, a Bíblia é uma
coleção de livros, mas também é mais do que apenas uma coleção
de livros. Eles
são livros, mas são mais do que apenas livros.
Mais
adiante nós vamos chegar a palavras como inspiração, e revelação,
e “Deus soprou” (no que eu creio - mas estou me adiantando), mas,
por enquanto, é importante começar por afirmar o óbvio: A Bíblia
é em primeiro lugar, antes de mais nada, uma biblioteca de livros
escritos por seres humanos.
Digo
isto porque há um literalismo artificial que muitos têm encontrado
em relação à Bíblia, que faz grandes declarações sobre sua
divindade e inspiração e perfeição, e depois não sabe o que
fazer com a sua humanidade.
Por
que os quatro relatos da ressurreição nos evangelhos diferem em
detalhes básicos?
Por
que não existem denúncias claras de poligamia? Ou escravidão?
Por
que Paulo diz no Novo Testamento que ele está falando, não o Senhor
... ?
Quando
as pessoas definem com grande insistência: “esta é a palavra de
Deus” negligenciando o tempo todo a humanidade muito real desses
livros, elas podem, inadvertidamente, roubar desses escritos
justamente seu poder sagrado.
Tudo
por começar no lugar errado.
Você
começa com o humano. Você faz essas perguntas, você
entra ali (na Bíblia), você
direciona suas energias para entender por que essas pessoas
escreveram estes livros.
Porque
tudo o que você encontrar de divino nela, será através
do humano, e não em torno dele.
(Preciso
falar um pouco sobre onde eu quero levá-lo: se você deixar de lado
a natureza divina da Bíblia como ponto de partida, e mergulhar na
humanidade dela, você encontrará o divino de forma inesperada, em
maneiras que podem realmente transformar o seu coração. Esse é o
ponto, certo?)
Em
segundo lugar, um pouco sobre as perguntas.
Muitas
vezes, especialmente quando as pessoas encontram uma passagem
estranha ou macabra ou particularmente inexplicável, elas
vão perguntar:
Por
que Deus disse isso?
O
problema com essa questão é que ela pode deixá-lo amarrado em
todos os tipos de nós. (Sério? Deus disse-lhes para matar todas as
mulheres e crianças? Deus
disse? E
nós devemos aceitar que, bem, é assim que Deus é?).
Esse
tipo de coisa.
A
melhor pergunta é:
Por
que as pessoas acharam importante contar essa história?
seguida
por:
O
que foi que fez esse povo registrar essas palavras?
seguida
por:
O
que estava acontecendo no mundo naquela época?
e
então:
O
que esta passagem / história / poema / verso / livro nos diz sobre
como as pessoas entendiam quem eram e quem era Deus naquela época?
e
então:
Qual
é a história que está se desenrolando aqui e por que essas pessoas
pensaram que era uma história digna de ser contada?
Vamos
pegar uma dessas histórias:
a
de um dilúvio -
e
fazer esses tipos de perguntas.
Próximo:
O que é e Bíblia? Parte 2 - Inundações
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